sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

(des)conectados da realidade: plugados na fantasia do progresso da tecnologia e do conforto

Hoje eu ia escrever sobre filmes. Uma lista de filmes quaisquer que resolver fazer enquanto vasculhava a locadora do meu bairro a procura de um título que teimava em constar no sistema, mas ninguém, nem os funcionários da loja, encontrava. Isso fica para outro dia, quem sabe.

Ia ser assim até quando abri a revista Época desta semana e, como de costume, comecei de trás para frente. Primeira página a ser lida: a coluna de Ruth de Aquino. Não leio de trás para frente por causa dela (por favor, Ruth, sem ofensas, suas análises são ótimas, inclusives as das quais discordo). É um hábito anarquista que me dou por direito já que sou esquerdo. Não, não sou comunista, sou apenas canhoto.

Parece coisa boba, mas num mundo onde tudo é feito para destros e no qual muitas línguas e culturas conferem a essa variante psicomotora os nomes mais esdrúxulos e, às vezes, aterrorizantes. Entre left, sinistra e outros, os canhotos não devem ser deixados para trás e muito menos considerados pessoas diabólicas ou coisa parecida. Apenas vemos o mundo por um outro ponto de vista.

Muitos estão lá fora pulando carnaval, nas praias, em acampamentos evangélicos, retiros espirituais. Eu aqui... postando num blog. O texto de Ruth de Aquino me esbofeteou a cara - e eu tive de dar a outra face. O incomodo de Ruth vai ao encontro do meu. O uso de celular se tornou um fenômeno viral que tem efeitos colaterais ingratos nas relações interpessoais e na construção da realidade.

Não plugue seu celular na fantasia de que o artefato de comunicação que revolucionou a troca de informações juntamente com a internet civil na última década é um mimo gracinha e um refugio de segurança, ou, ainda, um alívio na angústia de solidão urbana.

O celular invadiu nossa praia, nosso quarto, nossa cama e nossos relacionamentos. [eis o inevitável(?): acabo de ser interrompido pelo toque do meu aparelho. será que essa ligação podia esperar? quem sabe...]

Segue trecho do texto da Ruth até eu me sintonizar novamente nas minhas idéias e lembrar o que estava em vias de escrever:

Os aparelhos celulares passaram de 150 milhões no Brasil em dezembro. Antes era só a voz. Com texto e e-mail, nossa cara se enfia na tela. O vício de estar plugado se alastra. Quantos de nós já perderam os limites da educação e do pudor no uso do celular e se tornaram reféns da comunicação em tempo real? Levamos o aparelho para o banheiro, a cama, a mesa, o museu, o batizado, o casamento e o funeral. Quantos de nós ainda têm tempo para a reflexão?

As ligações telefônicas invadem atos que costumavam ser praticados do início ao fim, com uma dedicação de corpo e espírito que dava sentido ao presente.

Ruth cita o romance Fantasma sai de cena do autor norte-americano Philip Roth. Nele, um escritor volta a Nova Iorque depois de se isolar por dez anos nas montanhas. O ex-ermitão dá de cara com um novo mundo a sua frente. Não pelas mudanças mundanas esperadas da evolução tecnológica e/ou cultural, e sim pelo egoísmo e a urgência das pessoas. "O que acontecera que agora havia tanto a dizer e com tanta urgência que não dava para esperar? (...) Havia também um lado trágico nisso. A anulação da experiência da separação. (...) Você sabe que pode ter acesso à outra pessoa a qualquer momento, e, se isso se torna imposs;ivel, você fica impaciente e zangado, como um deusinho idiota."


E continua Ruth dissertando e eu cá comigo concordando. Os telefones avançando pela progressão geométrica da capacidade de processamento dos chips. Chegam os smartphones e os stupid users...

Sou psicólogo e já ouvi muitos relatos de pessoas que falam: Doutor, eu juro que escuto meu celuluar tocando e quando chego lá não tem nenhuma mensagem nem ligação. Quantos de nós ficamos angustiados ou deprimidos se passamos um dia sem receber ligações? Alguns mais espertos (?) impossibilitam tal condição ligando desesperados para toda a agenda de contatos.

Faça um exercício, dê a você mesmo uma excelente oportunidade. Desligue seu celular e seu computador por 24 horas. Sei que alguns profissionais, por força do ofício, necessitam (?) estar online 24/7; entretanto, cabe fazê-lo nos finais de semana e, friso com veemência, sobretudo durante as férias - se é que você ainda sabe o que é isso.

Conecte-se com a realidade, com o mundo!
Investa no progresso da sua felicidade...

Fonte: ALPHA


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